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Esta reflexão que compartilho aqui teve como ponto de partida o artigo do jornal O Estado de São Paulo (19/03/2017), intitulado “Autista, não: imigrante”.

Leia a íntegra do artigo no link abaixo.

http://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,autista-nao-imigrante,70001705273

A matéria relata o encaminhamento de crianças de escolas públicas para UBS (Unidade Básica de Saúde), da prefeitura de São Paulo, medicadas a partir das hipóteses diagnósticas de autista, déficit de atenção, dislexia, transtornos de aprendizagem. No entanto, depois de algum tempo, constaram que essas crianças eram imigrantes e não dominavam o nosso idioma, por isso se comportavam de maneira “estranha”.

Esse evento me fez refletir sobre as formas como olhamos o nosso entorno, a nós mesmos e o outro. Muitas vezes percebemos a realidade onde estamos inseridos, mas negamos os fatos, sem querer encará-los. Caímos em armadilhas mentais nos tornando ignorantes e insensíveis ao que se passa ao nosso redor, optando em não dar atenção ao velho ditado “cabeça vazia é armadilha do diabo”. Mas é uma escolha, o tal do livre arbítrio. O termo cabeça vazia, no sentido do esvaziamento, da negação da realidade que nos cerca, faz parte das armadilhas mentais que criamos, negando-nos a assumir compromissos com o que vemos, percebemos e, consequentemente, não agimos, por conta de nossos diabinhos internos.

A cabeça cheia, no bom sentido, é quando desenvolvemos diferentes aspectos: emocionais, intelectuais, sociais, financeiros, enfim, tentando diminuir o distanciamento entre a realidade particular e os fatos reais, o que nos leva a manter poucos relacionamentos e, algumas vezes, a sermos considerados ermitões ou esquisitos. Tudo depende da maneira como nós negociamos com nossos diabinhos.

No geral, a percepção da realidade, com base nos fatos verdadeiros, nos remete ao desconforto, à inquietação e à solidão. Cabeça vazia é uma armadilha, mas pode também ser uma lente opaca para diluir a ignorância e garantir a um grupo de pessoas o direito à vista cansada, tornando o seu próximo um ser invisível. A ignorância e a invisibilidade parecem o remédio perfeito para quem deseja ter a cabeça vazia. O preço disso é postergar a realidade presente e colher culpas, arrependimentos, dores e sofrimentos no futuro.

Em outras palavras, manter a cabeça vazia é uma prática usual da ignorância, de muitos gestores públicos, pais, amigos, cônjuges, familiares. É uma tentativa de manter a “vista cansada”, apesar da consciência pesada. É criar armadilhas diabólicas para si e para todos que necessitam de um olhar de humanidade e solidariedade. Cabeça cheia não é garantia de prevenção, mas, pelo menos, é uma tentativa de não ignorar nem tornar invisíveis pessoas inocentes, que são contaminadas por nossas cegueiras mentais.  Aliás, o “diabo” adora a ignorância, por isso, ele próprio é invisível e não lida com o real e, sim, com nossos medos e fantasias.

Sugiro um exercício. Na escala de 0 a 10, dê uma nota a você para definir como se comporta diante da realidade que o cerca. Pergunte a três amigos ou entes significativos se eles te consideram uma pessoa conectada à realidade. Peça a eles que também deem uma nota de 0 a 10. Use o mesmo tipo de escala para dar notas à sua mente humana afetiva nas suas relações interpessoais, conjugais, familiares e profissionais.

Seja crítico ao avaliar o resultado e perceba se, assim como tantos, não estamos passando por um período de cegueira mental, tendo o nosso próximo como ser invisível, fruto de nossa ignorância.

Um abraço a todos e até a próxima semana!

Sebastião Souza

 

Ignorância e insensibilidade: componentes relevantes das armadilhas mentais
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