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No nosso artigo “Ao mestre com… Pancadas?! – A violência líquida nas escolas”, os maus tratos sofridos pelos professores é o centro de nossa indignação. Desta vez, vamos discutir a violência entre os alunos.

A mídia noticiou, recentemente, dois assassinatos e quatro tentativas de homicídio, praticados por um adolescente de 14 anos contra colegas, na sala de aula de uma escola em Goiás.

Esse estranho antagonismo – espaço do saber x espaço de violência – chama atenção. No entanto, se analisarmos a fundo, essa guerra começa muito antes, em outro espaço: nas famílias.

É fato que, por diversas razões, muitas delas sofrem do mal denominado “cegueira emocional”. O que leva pais, professores, amigos, vizinhos, eu, você não percebermos indicadores de atitudes suspeitas, capazes de desencadear tanto ódio e agressividade em um adolescente?

A invisibilidade nas relações conjugais, familiares, sociais é a “couraça emocional” que muitos usam para não enxergar nem acolher os sentimentos de pessoas próximas, entes queridos, acometidos por ódio, tristeza, depressões ou outros processos destrutivos ou autodestrutivos quaisquer.

A cultura de resolver questões de relacionamentos conflituosas, matando ou eliminando aquele que se imagina ser o inimigo, vem ganhando fôlego. O jornal “Folha de SPaulo” (21 de outubro de 2017) publicou  um estudo  realizado pelo Centro de Pesquisas Pew (EUA) sobre a possibilidade de professores e funcionários passarem a portar armas  nas escolas. Dentre os pesquisados que possuíam armas, 66% aprovaram a ideia. Entre os que não a possuíam, esse índice caiu para 35%.

A solução “prática” e terrorista de combater a explosão homicida de adolescentes e adultos descompensados, vítimas de distúrbios mentais e emocionais, parece-me insana.

É tão fora de propósito imaginar um professor portando uma metralhadora ou um revólver enquanto ensina sobre ética, valores, paz e afins.  Essa ideia estapafúrdia retrata, claramente, o retrocesso da civilização humana.

A pesquisadora Marleen Wong, da Universidade do Sul da Califórnia, rejeita a proposta e sugere o projeto de prevenção Aware (alerta, em inglês), com o objetivo de construir recursos e ferramentas para antecipar acidentes, treinando professores e funcionários para que observem “mudanças de comportamentos, baixo desempenho escolar, desenhos perturbadores ou textos agressivos com relatos de agredir outras pessoas”. Muito mais cabível se estamos aqui para construir uma sociedade mais saudável e equilibrada.

A prática de enxugar gelo precisa acabar

O que adianta eliminar o efeito sem trabalhar a causa? Por que um adolescente resolve matar seus colegas no lugar de conversar ou até mesmo exigir que estes se desculpem de qualquer ofensa que o tenha magoado? O que levou essa recém-criança (sim, porque ele foi, até pouco tempo, uma criança) a se tornar um assassino? Como está a mente e o coração desse rapaz? Claro que não defendo deixá-lo impune, afinal, ele precisa sofrer as consequências dos seus atos, mas, paralelamente a isso, como cortar o mal pela raiz, evitando que outros incidentes como este aconteçam nas escolas de nossos filhos e netos?

O que a ciência já sabe, por diferentes e inúmeros estudos, é que os vínculos afetivos bem-estruturados, estabelecidos entre criança e adolescente com pais e cuidadores, são essenciais para a saúde mental e à construção de uma personalidade sociável, afetiva e responsável.

Ambientes perturbados por diferentes violências, desrespeito, machismo, sem afeto e diálogo, geram jovens e adultos perturbados.

Uma vez ouvi um avô reclamar que seu neto estava agressivo e que os pais da criança diziam que todas, nessa idade, são assim. Certa feita, a criança chutou a perna desse avô, na frente de todos. O pai começou a gritar e partiu para bater no filho. Ou seja, esse pai não se deu conta de que sua agressividade era a referência de seu filho para resolver conflitos.

Não adianta dizer o contrário, porque é fato: agressividade gera agressividade. Precisamos armar professores e funcionários da escola de amor, aceitação e solidariedade para que possam observar as atitudes e comportamentos dos “órfãos de pais vivos”, depositados nas salas de aula lotadas, tornando-se invisíveis. Até que uma explosão desmedida de ódio lhes confira a identidade de assassinos estampada na capa do jornal.

Sebastião Souza
Psicoterapeuta de casais e famílias 

Escola: palco de conhecimentos ou campo de guerra?
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