
Por isso, somos privilegiados na escalada da vida. Mas um número significativo de pessoas nunca vai realizá-la, porque não sobrevive a ela. Não poderão apreciar o ar frio e fresco do topo dessa montanha, nem ver, de cima, a beleza dos campos esverdeados das planícies ao pé dela.
Possivelmente, dentre os não sobreviventes, teriam grandes ecologistas, antropólogos, arqueólogos, enfim, especialistas que retratariam a infinita beleza de ser uma alpinista frente a subidas íngremes que os obstáculos impostos pela vida nos são dados a enfrentar.
A escalada dessa montanha requer pulsão de vida. Muitos se apegam à base dela e referendam a pulsão de morte (1). A subida não está disponível a todos, somente aos sobreviventes da luta entre vida e morte.
Sabemos que, ao nascer, estamos todos em semelhantes condições com as nossas heranças genéticas (pais) e socioambientais (trocas com o meio). No entanto, com o passar do tempo, algumas pessoas singulares, possuidoras de diferencias, não se contentam em contemplar a natureza só na base da montanha. Esses indivíduos querem ser autênticos, são curiosos e ousados, por isso desfrutam plenamente da condição de alpinista que, como eu e você, todos carregam dentro de si.
Nós nascemos e somos colocados na base da montanha (família). Diferenciar-se dos demais significa empenhar-se em crescer e se desenvolver na direção de nossas potencialidades, um trabalho árduo e digno, de quem acredita que está dando o melhor de si para fazer parte da natureza viva que pulsa dentro e fora de cada um de nós.
Nas famílias, os que saem para a escalada, em busca do topo da montanha para enxergar novos horizontes e ampliar suas percepções de mundo, algumas vezes são considerados ingratos e infiéis. Mas nem sempre esse julgamento é justo.
Existem os que se arriscam a evoluir nas mais diversas dimensões (espirituais, materiais, emocionais e intelectuais), com o objetivo de se desenvolver e ajudar os que ficaram na base da montanha (família) ou se tornaram fantasmas, por não sobreviveram aos desafios.
O alpinista é aquele ser que não mede esforços para alcançar seus objetivos em direção ao processo evolutivo pessoal e o bem-estar do próximo.
Continua sua empreitada tentando agarrar a montanha pelas entranhas, mesmo consciente do perigo que corre, uma vez que o risco de morte é constante. Porém, prefere arriscar-se do que ficar na inércia, na base da montanha (seio familiar), e com isso minimizar e desconhecer o seu amplo universo de possibilidades.
Tem em mente que só quando o ser humano dá o melhor de si é que conhece as inúmeras fontes de vida que o universo oferece, saindo da base de conforto para perceber a força de seu mundo interior.
O alpinista tem consciência da sua ignorância frente aos caminhos e circunstâncias que a vida oferece. Ele luta para sobreviver e fazer diferença por meio de sua singularidade, sempre respeitando o próximo e a mãe natureza que, algumas vezes, prega peças nos que ousam desafiá-la.
Escalar a montanha (vida) é luta para poucos, uma vez que, somente os dotados de garra e esperança, conseguem alcançar o tão sonhado topo.
Afinal, todos vão morrer. Os que não sobreviveram à escalada não terão a oportunidade de exercer o seu lado alpinista e, como tal, não poderão assistir ao raiar do sol. Mas em você, alpinista, a vida pulsa mais forte que a morte.
Faça sua escolha ou fique na base da montanha (seio familiar). Permaneça indiferenciado ou inicie sua escalada agora. Boa sorte!
(1) Na sua teoria das pulsões Sigmund Freud descreveu duas pulsões antagônicas: Eros uma pulsão sexual com tendência à preservação da vida, e a pulsão de morte Tântalo que levaria à destruição de tudo o que é vivo.