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As experiências clínicas no trabalho com casais têm demonstrado como é relevante o profissional saber de que maneira a parceria conjugal foi construída.

Normalmente, o início dos relacionamentos acontece em dois momentos significativos da vida das pessoas envolvidas: quando estão “cheias” ou quando estão “vazias”.

Os momentos “cheios” são aqueles em que o indivíduo acredita que parte do seu projeto de vida está cumprida – bem encaminhado nos estudos, profissionalmente estabilizado, casa ou apartamento próprio, carro pago e, de preferência, com alguma reserva para não depender financeiramente de ninguém. Uma fase em que se sente necessidade de investir em um (a) parceiro (a) para construir um casamento/família. Essa é uma fantasia reforçada pela nossa cultura pragmática. Ou seja, se essas questões materiais e intelectuais estão definidas, as emocionais se ajustarão depois, quem sabe até com essa nova união.

Mas falemos agora dos momentos “vazios”. Pessoalmente, acho mais fácil identificá-los, porque, geralmente, são marcados por lutos, separações conflituosas, perdas, depressão, término de outro relacionamento significativo, problemas no trabalho, desemprego, alguma experiência de rejeição… Enfim, vivências que causam sofrimento.

Nas duas circunstâncias, a entrada de um (a) parceiro (a) tende a preencher “espaços”. Quando é essa a dinâmica, provavelmente, no médio e longo prazos, a qualidade da relação será prejudicada.

Vejamos o exemplo de um casal que se conhece em uma festa.

O rapaz está muito animado, dançando, se divertindo. Do outro lado, uma moça triste, porque acabou um relacionamento muito significativo para ela. Nesse instante, rola uma paquera entre os dois. Ele se mostra interessado, ela se sente valorizada. Ele, então, vira o “salvador” dela porque, por um momento, é capaz de fazê-la esquecer-se de sua tristeza (capaz de “enchê-la”). A moça passa a ocupar o espaço da pessoa frágil e insegura, o que pode se tornar um problema mais tarde, quando ela não precisar mais ser “salva” das suas tristezas.

Vamos supor que o rapaz que “salvou” a moça triste está vivendo o seu momento “cheio”, com todas as questões de sua vida bem equacionadas. Ele quer casar, ter filhos, começando uma corrida contra o tempo par encontrar a pessoa ideal. Essa pessoa provavelmente irá ocupar um pequeno espaço que sobrou de tudo o que ele acredita estar resolvido em sua vida. E é nesse lugar que a moça triste ficará para que ele não perca a sensação falsa de que tem o controle dessa equação perfeita, que ele não vai abrir mão em função da parceira.

A escolha dos dois é feita inconscientemente. Dela, para se preencher de aceitação e aplacar sua dor. Dele para não deixar que nada se desencaixe do que ele planejou e o “encheu”. Mas ela, que um dia não vai querer ser salva, talvez também perceba que ele, no fundo, é frágil demais e dependente. Ou ele pode achar que estar no comando, sendo o detentor do poder material, é um problema.

Ele não queria assumir tudo sozinho. E assim a relação começa a ruir.

Por isso, caso a construção do seu relacionamento conjugal se identifique com alguns desses exemplos, é hora de ligar o sinal de alerta. Não precisa se apavorar, afinal, nossa existência é um laboratório de experiências. Por isso, de uma chance a você e a (o) sua (seu) parceira (o). Procure identificar qual o espaço emocional e afetivo que você reservou para colocar alguém na sua vida.

Reconstrua alguns “nós cegos” não desatados com seus pais e familiares. Lembre-se que essa pessoa com quem você está vivendo atualmente foi a melhor “escolha” que pode fazer naquele momento da sua história.

Aprenda a se perdoar por suas “cegueiras emocionais”. Afinal, quem enxerga bem quando se trata do amor?

Estamos vivenciando um tempo de festas e reconciliação. Aproveite para se encontrar não no outro, mas em você mesmo. Descubra um jeito amoroso e saudável de encarar a vida. Não deixe de transmitir a sensação desse reencontro com sua essência a quem convive contigo. Mostre suas boas descobertas por meio de atitudes que, com certeza irão contaminar todos a sua volta.  Boa sorte e bons recomeços!

Sebastião Souza
Psicoterapeuta de casais e famílias

Sua relação afetiva começou quando você estava “cheio” ou “vazio”?
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